Em 2018, completamos 30 anos da promulgação da Constituição Cidadã. Embora nestas três décadas o país tenha conquistado muitas vitórias, vivemos um momento de recesso democrático e rupturas sociais. Com o acirramento de opiniões, preferências eleitorais e disputas ideológicas, paramos de ouvir o outro e rompemos um pacto, gerando a intolerância e o nascimento de iniciativas autoritárias oriundas de segmentos diversos da sociedade.

Vivemos, ainda, um momento em que as desigualdades voltam a crescer, se somam à degeneração de políticas sociais e atingem os grupos mais pobres, provocando o esgarçamento do tecido social e o enfraquecimento das redes de proteção social e também da sociedade como um todo, pois geram violência, desconfiança nas instituições e o enfraquecimento da nossa democracia.

Nesse contexto de crise e descrença, é fundamental que a sociedade civil assuma um papel de protagonismo, como já o fez em outros momentos importantes de nossa história.

O contexto eleitoral de 2018 é uma oportunidade para que cada um de nós possa sair de sua bolha para debatermos ideias que possam viabilizar a construção de pontes entre diferentes posicionamentos. Não precisamos pensar da mesma forma, mas erguer novas bases que sustentem uma sociedade mais justa e próspera.

O investimento social privado, composto por fundações, institutos e empresas, precisa, mais do que nunca assumir um compromisso com a promoção da democracia e das condições imprescindíveis para realizá-la. Uma dessas condições é o fortalecimento de ações que buscam a participação política e o debate público sobre que projeto de país queremos e o encorajamento do envolvimento do cidadão na política. As instituições que atuam no campo social do investimento privado precisam ousar e trabalhar para apoiar essas pautas. 

O TERRITÓRIO IMPORTA!
Criada em 2006, a Fundação Tide Setubal é uma organização não governamental de origem familiar que historicamente vem atuando nas periferias de São Paulo para a superação das desigualdades socioespaciais. Desde o início de sua atuação, sempre teve como princípio a crença nas organizações periféricas, entendendo e reconhecendo a importância dos trabalhos por elas realizados, dando visibilidade e fortalecendo essas iniciativas.

A diretriz o território importa se alinha à missão de fomentar iniciativas que promovam a justiça social e o desenvolvimento sustentável de periferias urbanas e contribuam para o enfrentamento das desigualdades socioespaciais das grandes cidades, em articulação com diversos agentes da sociedade civil, de instituições de pesquisa, do Estado e do mercado.

A escuta permanente, o diálogo e o fazer com as comunidades são princípios que geram um conjunto de experiências e de conhecimentos determinantes para o exercício da cidadania e estimulam as forças locais para uma atuação mais democrática.

A parceria com o Instituto Update para a pesquisa Emergência Política Periferias está nesse contexto.

As mais de 400 iniciativas mapeadas e as 100 entrevistadas em profundidade revelam um grande mapa de práticas de inovação política a partir dos territórios, espaços carregados de memórias, inventividade e potencialidade. Além de dar visibilidade às práticas, a pesquisa revela narrativas sobre as periferias que rompem estigmas e revelam as soluções desenvolvidas para garantir direitos constitucionais.

Outra frente de apoio e fortalecimento criada é a construção da chamada de projetos Elas Periféricas. Essa forma de financiamento reflete uma nova abordagem de investimento social, pautada pela escuta ativa e cocriação de todo o processo com pessoas envolvidas na transformação social (internos e externos à Fundação Tide Setubal), bem como a definição coletiva de princípios e critérios que dão norte não apenas a essa chamada, mas também a todos os nossos aportes de recursos futuros para iniciativas em territórios periféricos.

Existem encontros e fronteiras no contexto democrático, mas é preciso construir pontes, articular setores, unir e ouvir diferentes vozes para que possamos recuperar a capacidade de avançar na democracia, na cidadania e no desenvolvimento.

*Maria Alice Setubal, a Neca, é socióloga e educadora; doutora em psicologia da educação, preside os conselhos da Fundação Tide Setubal e do Gife – Grupo de Institutos Fundações e Empresas.